04 agosto 2010

Motricidade Voluntária

Um resumo básico sobre como funciona a motricidade voluntária no corpo humano.

A via da motricidade voluntária compreende dois tipos de neurônios. O primeiro é o neurônio motor superior que liga o córtex aos núcleos dos nervos cranianos ou espinais, os quais contêm  o neurônio periférico ou neurônio motor inferior, que inerva os músculos estriados esqueléticos.

O segmento central da via motora voluntária é constituído pelos neurônios motores superiores agrupados, constituindo uma via compacta e cruzada. Portanto, o déficit de tipo central é global, cruzado, se a via for atingida acima do cruzamento, e homolateral, se atingida abaixo. O segmento periférico é constituído pelos neurônios motores inferiores, tendo sua origem ao longo do corno anterior da medula e distribuído pelas raízes, plexos e troncos nervosos periféricos. O déficit de tipo periférico é, portanto, parcial, localizado em certos músculos.

Os axônios do neurônio motor periférico saem da medula através da raiz anterior (motora) e dirigem-se, sem interrupção, até o músculo estriado, onde fazem sinapse com a membrana da fibra muscular. Denomina-se unidade motora ao conjunto formado pelo motoneurônio periférico e as fibras musculares por ele inervadas. 

O neurônio motor inferior é a via final comum dos impulsos que alcançam o músculo estriado. Ou seja, os distintos impulsos motores originados nas formações supra-segmentares e nas formações nucleares do tronco encefálico são transmitidos ao músculo estriado através do neurônio motor periférico. 

O feixe corticospinal ou piramidal constitui o segmento central da via motora voluntária. Origina-se no córtex, predominantemente no giro pré-central (área motora 4). Sabe-se hoje, que outras áreas participam da formação do trato piramidal, principalmente a área 6 do lobo frontal e as áreas 3, 2 e 1 do lobo parietal. O córtex cerebral é formado por seis camadas celulares. O trato pirami dal origina-se da quinta camada celular.
Wilder Penfield, por meio de estimulação em pacientes cujo córtex fora exposto para cirurgia de epilepsia, identificou os vários pontos motores de origem do trato piramidal, traçando o mapa da área motora, denominado homúnculo de Penfield. Este retrata a figura humana proporcional à sua representação cortical. As áreas do corpo capazes de executarem movimentos mais finos possuem maior representação cortical.
A estimulação elétrica do córtex cerebral determina movimentos contra laterais nos membros e na porção inferior da hemiface; enquanto os músculos do tronco, da mastigação, da porção superior da face, da faringe e da laringe respondem bilateralmente. Portanto, os motoneurônios que inervam os membros e a porção inferior da hemiface recebem apenas fibras do córtex cerebral contralateral; enquanto os motoneurônios inferiores que inervam os músculos do tronco, da mastigação, da faringe e do terço superior da face recebem fibras do córtex cerebral contralateral e homolateral.
Assim, o déficit de tipo cortical é a hemiplegia cruzada incompleta e não proporcional, ou seja, um dos membros (superior ou inferior) é mais acometido que o outro.



O córtex motor primário ocupa área extensa situada em grande parte da convexidade do hemisfério cerebral e também em sua porção medial. Portanto, é difícil para uma só lesão comprometer todo o córtex motor. Geralmente ocorre o comprometimento de apenas parte da área motora. Assim, pode ocorrer o comprometimento da face lateral do hemisfério, determinando paralisia do membro superior e da porção inferior da hemiface (hemiplegia braquiofacial). No comprometimento isolado da face medial da área motora ocorrerá paralisia do membro inferior contralateral (monoplegia crural). A lesão da área motora pode estar acompanhada de lesões em áreas vizinhas. Assim, a concomitância de alteração de função cortical superior, como, por exemplo, afasia, traduz lesão cortical. A presença de crises epiléticas focais também indica lesão cortical.

As fibras originadas dos corpos celulares situados na quinta camada do córtex motor tomam trajeto descendente, penetrando na substância branca subcortical (centro oval).

Centro oval: uma lesão aí determina hemiplegia cruzada,incompleta e não proporcional, portanto, de tipo cortical.

Cápsula interna: após atravessarem a substância branca subcortical (centro oval), as fibras do trato piramidal atingem a cápsula interna, conjunto de fibras situadas entre o tálamo e o núcleo lentiforme (estrutura anatômica formada pelos núcleos putame e globo pálido). Na cápsula interna, as fibras corticospinais estão próximas de outras fibras originadas no córtex motor (fibras corticorrubrais, corticorreticulares e corticopontinas). Assim, a hemiplegia resultante de lesão vascular junto à cápsula interna está associada à lesão de várias vias e não somente do trato piramidal. Nessa região, as fibras corticofugais encontram-se condensadas em pequena área e são, portanto, bastante vulneráveis. O déficit tipo capsular é representado por hemiplegia cruzada, completa (face, membros superior e inferior) e proporcional (déficit motor similar nos membros superior e inferior). Pode ocorrer também déficit sensitivo (lesão das radiações talâmicas somestésicas) e hemianopsia (lesão da radiação óptica).

No tronco cerebral, o feixe corticospinal ocupa a parte média do pedúnculo cerebral, a parte ventral da ponte e, finalmente, a porção ventral do bulbo (pirâmide bulbar). No bulbo, algumas fibras do feixe corticospinal dirigem-se ao funículo anterior homolateral da medula (feixe piramidal direto ou corticospinal ventral), e a grande maioria cruza a decussação das pirâmides, indo localizar-se no lado oposto para formar o feixe piramidal cruzado ou corticospinal lateral. Este vai localizar-se no funículo lateral da medula, sendo o mais importante do ponto de vista semiológico.

As relações dos nervos cranianos com o trato piramidal revestem-se de grande importância para o diagnóstico topográfico das lesões do tronco encefálico. No mesencéfalo, situa-se o núcleo do nervo oculomotor, e as fibras desse nervo atravessam a base do pedúnculo cerebral antes de emergirem junto à fossa interpeduncular. Na ponte, as fibras originadas dos núcleos dos nervos abducente e facial atravessam o trato corticospinal na base da ponte, antes de emergirem junto ao sulco bulbopontino. No bulbo, as fibras originadas do núcleo do nervo hipoglosso passam próximas ao trato piramidal para, em seguida, emergirem como nervo hipoglosso entre a pirâmide bulbar e a oliva. Nas pirâmides, as fibras corticospinais separam-se das demais fibras corticofugais, sendo, portanto, a única localização em que as fibras piramidais estão isoladas. Assim, as pirâmides bulbares constituem o único local cuja lesão determinaria a verdadeira síndrome piramidal. 

Na prática, a síndrome piramidal pura é muito rara, e a denominação revela-se inadequada, mantendo-se por força da tradição. A lesão da via motora junto ao tronco cerebral geralmente determina hemiplegia alterna, isto é, hemiplegia contra lateral à lesão, acompanhada de sintomas e sinais homolaterais do acometimento de um ou mais nervos cranianos. A lesão mesencefálica determina hemiplegia contralateral completa e proporcional. Freqüentemente ocorre também lesão das fibras intraparenquimatosas originadas do núcleo do nervo oculomotor. Essas lesões determinam a síndrome de Weber, caracterizada por hemiplegia contralateral, ptose palpebral, desvio lateral do globo ocular e midríase homolaterais. A lesão pontina determina hemiplegia proporcional contralateral. Esta hemiplegia é completa quando a lesão se localiza acima do núcleo do nervo facial (acometendo, portanto, a via corticonuclear) e incompleta quando a lesão se situa abaixo. 

Freqüentemente ocorre comprometimento associado das fibras intraparenquimatosas originadas nos núcleos dos nervos abducente e facial. O quadro clínico manifesta-se por hemiplegia contralateral à lesão, desvio medial do globo ocular e paralisia facial periférica homolateral (síndrome de Millard-Gubler). A lesão bulbar acima da decussação das pirâmides determina hemiplegia proporcional contralateral e incompleta (a face não é acometida). É freqüente a lesão das fibras intraparenquimatosas do nervo hipoglosso, determinando paresia da hemilíngua, homolateral à lesão.

Na medula, o feixe piramidal lateral apresenta-se como via agrupada e compacta na metade posterior do funículo lateral. O déficit tipo medular unilateral é a paralisia homolateral, global e proporcional abaixo da lesão. O déficit tipo medular bilateral é a paralisia bilateral global e proporcional, abaixo da lesão. A lesão centromedular, na medula cervical, pode acometer parcialmente o trato piramidal, determinando tetraplegia incompleta, não proporcional, com comprometimento mais intenso dos membros superiores. Este quadro ocorre mais freqüentemente nos traumas raquimedulares (síndrome de Schneider). No trato piramidal, na medula cervical, ocorre característica estratificação das fibras mediais, destinadas aos membros superiores, e das fibras laterais, destinadas aos membros inferiores. Assim, a lesão centromedular cervical pode acometer preferencialmente as fibras mediais do trato piramidal, determinando diplegia braquial. O feixe corticospinal  termina no ápice dos cornos ventrais da medula.

Neurônio motor inferior

O motoneurônio inferior se origina nos cornos ventrais da medula. As raízes ventrais estendem-se conforme os miótomos embrionários, portanto, com distribuição topográfica e não funcional. O déficit radicular ou segmentar é homolateral, localizado em determinados músculos pertencentes ao mesmo miótomo. Em razão de os músculos apresentarem inervação plurirradicular, o déficit radicular é sempre incompleto.
As principais raízes inervam os seguintes grupos musculares dos membros, enumeradas esquematicamente:

C5 — músculos dos ombros.
C6—músculos da região anterior do braço.
C7 — músculos das regiões posteriores do braço e antebraço.
C8 — músculos da região anterior do antebraço e lateral da mão.
T1 — músculos da região medial da mão e os interósseos.
L3 — músculos da região anterior da coxa.
L5 — músculos da região ântero-lateral da perna.
S1 — músculos da região posterior da perna.

Os plexos reagrupam os motoneurônios das raízes ventrais em troncos nervosos periféricos, diferenciados funcionalmente. Assim, o déficit troncular atinge músculos que têm a mesma função, sendo, portanto, de distribuição funcional e não topográfica. Cada músculo recebe sua inervação de um só tronco e, portanto, o déficit troncular é sempre completo.

Os nervos, de forma esquemática, respondem pelas seguintes funções:
Axilar: abdução do braço.
Musculocutâneo: flexão do antebraço.
Mediano: flexão do punho e dos dedos, pronação e pinça polidigital.
Ulnar: movimentos dos dedos (preensão e movimentos laterais dos dedos).
Radial: extensão do antebraço, da mão e dos dedos, supinação e abdução do polegar.
Obturador: adução da coxa.
Femoral: extensão da perna.
Ciático: flexão da perna.
Tibial: flexão plantar do pé e dos pododáctilos.
Fibular: flexão dorsal do pé e dos pododáctilos (extensão).


Fonte: GUSMÃO, SS; CAMPOS, GB; TEIXEIRA, AL. Exame Neurológico. Bases Anatomofuncionais. 2ª edição.

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